domingo, 16 de novembro de 2008
LEITURA OBRIGATÓRIA: Graciliano Ramos
Escritor alagoano (27/10/1892- 20/3/1953). É um dos expoentes da Geração de 30 do Modernismo. Nascido em Quebrangulo trabalha como jornalista, comerciante e diretor da Instrução Pública de Alagoas. Em 1928, é eleito prefeito de Palmeira dos Índios (AL), mas renuncia dois anos depois. Em 1933, lança seu primeiro romance, Caetés. Na ocasião, mantém contato com escritores da vanguarda nordestina, como José Lins do Rego e Rachel de Queiroz. Em 1934, publica uma de suas obras-primas, São Bernardo. Acusado de subversão comunista em 1936, fica preso por 11 meses no Rio de Janeiro, experiência que narra em Memórias do Cárcere (1955). Quando é solto continua no Rio como jornalista e inspetor de ensino. Na década de 40, filia-se ao Partido Comunista. Com linguagem precisa e preocupação social, sua obra é um exemplo da abordagem da literatura como meio de conhecimento e mudança da realidade, típica da segunda geração modernista. Entre suas obras destacam-se ainda Angústia (1936) e Vidas Secas (1938). Morre no Rio de Janeiro.
INTERTEXTUALIDADE
Lendo “Vidas secas”, ficou-me gravada, na mente, uma frase, um achado de Hemingway, em “The old man and the sea” (O velho e o mar) The man can be destroyed, but never defeated” (“O homem pode ser destruído, mas nunca derrotado”).
“The old man and the sea”, publicado em 1952; Vidas secas, em 1938.
Sem estabelecer paralelos, quase sempre irônicos, vejo uma grande homologia nas posições de Santiago (protagonista de Hewmingway) e de Fabiano (protagonista de Graciliano). Um, personagem da água, o outro, personagem da terra – seca. Um pescador o outro vaqueiro. Figuras comuns, mas, paradoxalmente, epópeicas, não pode ser detido, derrotado, pode ser, sim, destruído, pela ação da natureza ou pelas forças do poder dominante; porém, qual Fênix rediviva, renasce, retorna e, em algum dia, conseguirá se sobrepor aos seus opressores.
Essa a mensagem dos dois grandes demiurgos, dois humanistas, preocupados com os dominados, os usurpados, os perseguidos, os descamisados, os excluídos, os “inempregáveis”. Retratam o drama do povo em face da escalada materialista que envolve todo o mundo capitalista, liberal, neoliberal ou qualquer outro jorgão usado para doirar a pílula da opressão.
E quando teremos um mundo sem opressão? “Suprimi a exploração do homem pelo homem e tereis suprimido a exploração de uma nação, por outra”.
Nos seus romances, nos seus contos, nas suas novelas, nas suas crônicas, nos seus poemas, encontramos a verdadeira História, a História dos vencedores, mas também a História dos vencidos, porque essa só aparece na ficção e na poesia. A história dos proletários e dos campesinos não existe para a história oficial.
Nós, que trabalhamos a literatura, emocionamo-nos quando encontramos uma escritura dessa qualidade estética, preocupada em desvelar a realidade do mundo empírico. E pensamos que nem tudo está perdido...
Pra Ezra Pound, o artista é a antena da raça, e a nação que negligencia as suas percepções entra em declínio; depois de um certo tempo, ela cessa de agir e apenas sobrevive...!
Livro Graciliano Ramos: cidadão e artista, ABEL, Carlos Alberto dos Santos, UNB, Brasilia 1999.
RESUMO
Em capítulos curtos, “Vidas Secas” relata a história de uma família de retirantes nordestinos obrigadas a se deslocar de tempos em tempos para áreas menos castigadas pela seca. Fabiano, um chefe da família rude, estabelece a família em uma fazenda abandonada. Ali passam a morar. O próprio Fabiano, a esposa Sinhá Vitória, seus dois filhos e a cachorra Baleia, uma companhia inseparável. Em um meio adverso, castigado pela aridez e pela ignorância, Fabiano tenta todas as alternativas para superar as privações, como ganhar o sustento como meeiro de um fazendeiro local, tendo direito à metade da produção. A experiência, porém, é reveladora da exploração do meio do mais fraco pelo mais forte. Certo dia, Fabiano sai para comprar mantimentos e começa a beber em uma venda. Um policial, chamado pelo protagonista de Solado Amarelo, aparece e o convida para jogar baralho, mas durante a disputa Fabiamo briga com o soldado e acaba preso e humilhado. Sinhá Vitória é mais articulada, sabe fazer contas, alerta o marido para o fato de que ele era seguidamente explorado e roubado pelo patrão. Fabiano, porém, não consegue reagir, pois não entende o código dos negócios e mal consegue dialogar com o superior. Mais à frente, Baleia adoece e Fabiano tem a dura tarefa de sacrificar a cachorrinha, mas não consegue e a deixa fugir: em um meio duro, em que os homens parecem se “animalizar”, o bichinho cumpre a trajetória de seus donos e se humaniza, mostrando traços de sofrimento e também de esperança. Por fim, a seca acaba atingindo a fazenda e Fabiano e sua família precisa se mudar mais uma vez, desta vez rumo à cidade grande. Os retirantes partem cheios de esperança de encontrar uma terra de oportunidades.
(Revista Veja, acesso 2008 & Cena do filme Vidas Secas de Nélson Pereira dos Santos)
Questão:
Texto I
(...) la chover. Bem. A catinga ressuscitaria, a semente do gado voltaria ao curral, ele, Fabiano, seria o vaqueiro daquela fazenda morta . Chocalhos de badalos de ossos animariam a solidão.
Os meninos, gordos, vermelhos, brincariam no chiqueiro das cabras. Sinhá Vitória vestiria saias de ramagens vistosas. As vacas povoariam o curral. E a catinga ficaria toda verde.
Lembrou-se dos filhos, de mulher, e da cachorra, que estavam lá em cima, debaixo de um juazeiro, com sede. Lembrou-se do preá morto. Encheu a cuia, ergueu-se, afastou-se, lento, para não derramar a água salobra. (...)
Chegou. Pôs a cura no chão, escorou-a com pedras, matou a sede da família. Em seguida acocorou-se, remexeu o aiô, tirou o fuziu, acendeu as raízes de macambira, soprou-as, inchando as bochechas cavadas. Uma labareda tremeu, elevou-se, tingiu-lhe o rosto queimado, a barba ruiva, os olhos azuis.
Minutos depois o preá torcia-se e chiava no espeto de alecrim.
Eram todos felizes. Sinhá Vitória vestiria uma saia larga de ramagens. (...) A fazenda renasceria – e ele. Fabiano, seria o vaqueiro, para bem dizer seria dono daquele mundo.
Os troços minguados ajuntavam-se no chão: a espingarda de pedemeira. A fogueira estalava. O preá chiava em cima das brasas. Uma ressurreição. As cores de saúde voltariam à cara triste de Sinhá Vitória (...) A catinga ficaria verde.
Graciliano Ramos, Vidas Secas.
Texto II
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que eu nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água.
Pra me contar histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
Lá sou amigo do rei
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Manuel bandeira , Libertinagem
Considere as seguintes análises dos textos I e II.
I. Ambos os textos contrapõem realidade e imaginação, descrevendo o embate de duas maneiras de vida situadas em pólos opostos.
II. O texto de Bandeira tem por tema a liberdade; o de Graciliano Ramos, a vitória sobre a natureza.
III. O texto I se organiza em parágrafos que alternam duas descrições: a da situação projetada no futuro e a da situação vivida no momento.
IV. O mundo projetado pelo texto II é baseado num novo prazer de viver; o projetado pelo texto I apenas corrige a distorção ocasionada pela natureza cruel, que castiga com a seca.
São corretas as análises:
a) I e II apenas.
b) III e IV apenas.
c) I, II e IV apenas.
d) II, III, IV apenas.
e) I, II, III e IV.
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